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Irã rejeita proposta de Trump e nega destruição nuclear: a retomada da tensão no Oriente Médio

Da Redação

O governo iraniano rejeitou oficialmente a proposta apresentada por Donald Trump para “desmantelar completamente” seu programa nuclear, classificando a exigência como “chantagem geopolítica e afronta à soberania nacional”. A resposta, feita pelo porta-voz do Ministério das Relações Exteriores de Teerã, marca o endurecimento das posições entre o Irã e os Estados Unidos e reacende o temor de uma nova escalada no Oriente Médio. A proposta de Trump, revelada após o cessar-fogo temporário em Gaza e durante negociações paralelas com Israel, previa a entrega supervisionada das centrífugas iranianas, o encerramento de instalações de enriquecimento de urânio e a adoção de um “novo tratado de não-proliferação regional” — em troca da suspensão de sanções e de um acordo econômico bilionário mediado por Washington.

A resposta iraniana: soberania, ciência e resistência

Em comunicado transmitido pela televisão estatal, o porta-voz iraniano Nasser Kanaani afirmou que “a República Islâmica jamais aceitará imposições ou negociações sob ameaça”, ressaltando que o programa nuclear do país é pacífico, científico e supervisionado pela Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA).

O governo de Ebrahim Raisi reiterou que o Irã não busca armas nucleares e que sua política energética inclui o uso civil da tecnologia atômica para geração elétrica, medicina e agricultura. Segundo Teerã, o que os EUA chamam de “ameaça” é, na verdade, uma tentativa de impedir o desenvolvimento tecnológico iraniano e manter o país dependente do Ocidente.

Um trecho do comunicado foi particularmente duro:

“Os Estados Unidos continuam acreditando que podem ditar o destino das nações soberanas com base na intimidação econômica e militar. Esse tempo acabou.”


Contexto geopolítico: a volta do confronto ideológico

A nova rodada de hostilidades marca a reedição do confronto de narrativas entre Washington e Teerã, num momento de redefinição das alianças globais. Desde o retorno de Donald Trump ao poder, os EUA retomaram uma política externa mais agressiva no Oriente Médio — centrada em apoio irrestrito a Israel, contenção do Irã e tentativa de enfraquecer os eixos emergentes entre Teerã, Moscou e Pequim.

O Irã, por sua vez, consolidou posição no bloco BRICS+, reforçando parcerias energéticas e financeiras com Rússia, China e Índia. Esse novo alinhamento geoestratégico limita a eficácia das sanções e amplia o espaço diplomático iraniano — algo que irrita profundamente Washington, que vê Teerã como parte do “arco de resistência” que desafia sua hegemonia.

O porta-voz da diplomacia russa, Dmitry Peskov, declarou que o “Irã tem direito legítimo à ciência e à tecnologia nucleares pacíficas”, e que qualquer tentativa de desmantelamento unilateral é “violação da soberania de um Estado membro das Nações Unidas”. A China também manifestou apoio discreto ao Irã, afirmando que o país é “parceiro estratégico para a estabilidade energética e a multipolaridade”.


Um cenário de múltiplas tensões

A rejeição da proposta americana ocorre num momento de alta tensão no Golfo Pérsico e de recrudescimento da crise em Gaza. Analistas observam que Washington tenta usar a questão nuclear como instrumento de coerção, não apenas para conter o Irã, mas para reafirmar seu poder sobre a região após anos de perda de influência.

O Pentágono reforçou sua presença militar no Estreito de Hormuz e no Mar Arábico, enquanto Israel intensificou as operações de vigilância aérea sobre o sul do Líbano e a Síria. Já o Irã respondeu com exercícios militares na costa de Bandar Abbas e anunciou novos testes de mísseis de cruzeiro, classificados como “defensivos”.

Especialistas do Instituto de Estudos Internacionais de Genebra alertam que qualquer erro de cálculo pode gerar um conflito direto de grandes proporções: um incidente naval, uma interceptação mal-sucedida ou um ataque por procuração pode ser suficiente para acender a centelha de uma guerra regional.


A dimensão econômica e energética

Por trás da retórica nuclear, há interesses econômicos evidentes. O Irã controla uma das maiores reservas de petróleo e gás do planeta e é ator-chave nas novas rotas energéticas que conectam o Golfo Pérsico, a Rússia e a Ásia. Com os BRICS e a Organização para Cooperação de Xangai (OCX) fortalecidos, Teerã passou a negociar em moedas locais e reduzir sua dependência do dólar.

A estratégia dos EUA de tentar sufocar o Irã economicamente visa impedir que o país amplie seu papel no comércio energético alternativo e que se torne elo essencial na rede logística euro-asiática. Em outras palavras, a proposta “nuclear” de Trump esconde uma tentativa de recolonização econômica, no formato típico da diplomacia coercitiva americana.


As reações internas no Irã

A população iraniana reagiu com forte sentimento nacionalista. Milhares foram às ruas de Teerã e Isfahan em apoio ao governo, levando cartazes que diziam: “Nosso urânio é nosso direito” e “Não seremos Iraque nem Líbia”. Intelectuais iranianos lembram que países que aceitaram desmantelar programas estratégicos sob pressão externa acabaram devastados por guerras e golpes patrocinados pelo Ocidente.

A oposição liberal iraniana, por sua vez, criticou o endurecimento do governo, dizendo que “a diplomacia deve prevalecer sobre a retórica de resistência”. No entanto, até mesmo analistas críticos ao regime reconheceram que a proposta de Trump era inaceitável, por exigir que o Irã renunciasse unilateralmente a algo que é garantido pelo direito internacional.


Conclusão: o retorno do impasse global

A recusa do Irã em aceitar o acordo imposto pelos EUA simboliza mais do que um conflito bilateral — ela representa a resistência do Sul Global à velha lógica da submissão. O que está em jogo não é apenas o enriquecimento de urânio, mas a autonomia científica, energética e geopolítica de um país que, apesar das sanções, continua de pé.

Trump tenta reconstruir um tabuleiro unipolar que já não existe. O Irã, por outro lado, posiciona-se como símbolo da autodeterminação em um mundo multipolar em formação. Se Washington insistir na escalada, o resultado poderá ser o oposto do desejado: consolidar ainda mais o eixo de alianças que desafia a hegemonia ocidental.

No fim, a recusa iraniana é uma mensagem clara: soberania não se negocia — nem sob sanções, nem sob ameaças.