Atitude Popular

“As moedas sociais estão remendando o que o Estado não consegue fazer”

No programa Bancos da Democracia, Heloísa Primavera e Luiz Arthur mostraram como moedas sociais e bancos comunitários se tornaram instrumentos de inovação para garantir liquidez local e fortalecer territórios diante da ausência do Estado

Inovação, território e política pública se cruzaram no programa Bancos da Democracia, apresentado por Sara Goes, que reuniu Heloísa Primavera, da RedLASES (Rede Latino-Americana de Socioeconomia Solidária) e do Projeto Colibrí, e Luiz Arthur, do Programa de Engenharia de Sistemas e Computação da COPPE UFRJ e do Observatório Brasileiro de Moedas Sociais. A matéria tem como fonte a entrevista exibida na TV Atitude Popular.
Logo no início, Heloísa resumiu o sentido das moedas comunitárias, “as moedas sociais estão remendando o que o Estado não consegue fazer”. Para ela, trata-se de um arranjo que nasce da necessidade, sem esperar que governos ou bancos resolvam problemas básicos de liquidez: “A sociedade civil desorganizada tinha se organizado para fazer o papel do Estado, o papel que o Estado não conseguia fazer, que era dar conta do desemprego e de atender as necessidades básicas da população”.

A inovação que começa ridícula
Heloísa provocou a audiência ao descrever o ciclo da inovação social: “Ela é ridícula, estão loucos. Depois, quando cresce, fica perigosa, porque os que achavam ridículo querem controlar. E, por fim, torna-se uma obviedade”. Recordou a experiência dos clubes de troca argentinos, que chegaram a sustentar seis milhões de pessoas entre 1995 e 2000. “Mais da metade da minha economia é feita sem dinheiro. Isso não entra no PIB. É o que chamo de Produto Interno Doce, que é o resto da economia, a maior parte dela”, disse.
Ao falar da moeda Palmas, criada em Fortaleza em 2002, reforçou que a inovação monetária no Brasil só ganhou escala por se articular às políticas públicas: “O Joaquim teve a sabedoria de criar uma moeda semilastreada. Mas hoje, com a plataforma e-Dinheiro, é possível ter na mesma aplicação uma moeda com e sem lastro. Isso muda tudo”.

Território, ciência e tecnologia
Luiz Arthur trouxe outro eixo de reflexão: “Ciência e tecnologia não são neutras, dependem de quem as faz e de onde são feitas. O território dá sentido às moedas sociais”. Inspirado em Bruno Latour e Milton Santos, defendeu que a inovação só ganha significado quando enraizada: “Os empreendimentos do circuito inferior da economia, os pequenos negócios, importam mais para o desenvolvimento do local. A moeda social é um instrumento para isso”.
Ele lembrou que o Brasil já conta com aproximadamente 200 experiências de bancos comunitários e moedas sociais: “Hoje tem de dez a quinze prefeituras utilizando moedas, e mais de cem prefeitos interessados em implementar. Isso está mudando de escala”.

Regulamentação e desafios futuros
A audiência também trouxe perguntas sobre o PL 4476, que trata da regulamentação das moedas sociais. Heloísa foi direta: “Não pode haver programa de economia solidária que ignore a raiz do problema: falta dinheiro, falta liquidez. Por isso, as moedas sociais sem lastro são fundamentais”.
Já Luiz Arthur avaliou que a regulação pode consolidar conquistas: “As moedas estão ficando mais visíveis. Mas precisamos aprofundar estudos, mostrar que elas podem se conectar com políticas de transferência de renda e fundos de desenvolvimento sem perder sua natureza comunitária”.

Exemplos e caminhos

O programa citou casos concretos. Em Niterói, a moeda Arariboia ajudou a irrigar empreendimentos solidários por meio de editais municipais. Em Maricá, a Mumbuca canalizou parte de sua circulação para fundos de desenvolvimento. Em João Pessoa e no Ceará, bancos comunitários instalaram placas solares e transformaram a economia de energia em moeda social: “Esse recurso volta para a comunidade em forma de moeda social. É uma forma de sustentabilidade financeira dos bancos”, explicou Luiz Arthur.

Heloísa encerrou com uma síntese: “O dinheiro é para construir comunidades, não é para fazer negócios”.

📺 Programa Bancos da Democracia
📅 De segunda à sexta
🕙 Das 8h30 às 9h30
📺 Ao vivo em: https://www.youtube.com/TVAtitudePopular
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