Atitude Popular

Big techs avançam sobre estatísticas oficiais e colocam soberania em risco, alerta pesquisa premiada

Tese de Oscar Arruda d’Alva, premiada pela Association of Internet Researchers, analisa a penetração de corporações digitais na produção de dados públicos e o impacto dessa aliança para países do Sul Global

Da Redação

O programa Democracia no Ar desta segunda-feira (11) recebeu o sociólogo e analista do IBGE Oscar Arruda d’Alva para discutir sua pesquisa “Estatísticas oficiais e capitalismo de plataforma: a transição para um regime de dataficação no Brasil”, reconhecida como a melhor tese do ano em português no campo de estudos da internet pela Association of Internet Researchers (AOIR). A entrevista, conduzida por Sara Goes com comentários de Sandra Helena, expôs como gigantes da tecnologia estão se inserindo em atividades historicamente exclusivas do Estado, com riscos diretos à soberania informacional.

Doutor em sociologia pela Universidade Federal do Ceará, Arruda explicou que a produção de estatísticas oficiais — como o PIB, o índice de inflação ou as pesquisas de emprego — sempre foi um bem público, orientado por métodos transparentes e conduzido por servidores especializados. “O que observamos é um movimento de aproximação entre o campo estatístico tradicional e o campo algorítmico, liderado por big techs, para transformar dados públicos em mercadorias”, afirmou.

A pesquisa mostra que, durante o governo Bolsonaro, esse processo se acelerou com a implantação, no Brasil, do Hub Regional de Big Data para a América Latina, sediado na Escola Nacional de Ciências Estatísticas do IBGE. O projeto integra uma rede internacional com hubs também em Ruanda, Emirados Árabes Unidos e Indonésia, gerenciados por uma organização sediada em Nova Iorque e financiada por Google e Microsoft. Oficialmente voltado à modernização, o modelo abriu espaço para que dados coletados pelo Estado fossem cruzados com fontes privadas, como informações de celulares e sensores, criando um mercado global de dados.

Arruda enfatiza que essa dinâmica não é apenas técnica ou econômica, mas profundamente política. “O poder algorítmico tem afinidade com regimes autoritários e com a extrema direita, como vimos nas conexões internacionais das big techs”, alertou. Segundo ele, a transição para um regime de dataficação redefine a lógica de produção das estatísticas: de instrumentos de cidadania e formulação de políticas públicas, elas passam a servir também à geração de lucro e à disputa geopolítica por informações estratégicas.

O estudo ainda analisa o conflito interno nas instituições públicas entre o “estatístico de Estado”, comprometido com a robustez metodológica e a transparência, e o “cientista de dados” moldado pelo empreendedorismo e pela lógica privada. Essa mudança de perfil profissional, observa Arruda, reforça a influência do setor corporativo sobre áreas sensíveis da administração pública.

Para o pesquisador, a entrada de corporações digitais na produção de dados oficiais não pode ser naturalizada. “Estamos falando de informações essenciais para a democracia e para a soberania, e sua privatização abre brechas graves para a dependência tecnológica e o controle externo”, concluiu.

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Teste de Oscar Arruda D’Alva: https://repositorio.ufc.br/bitstream/riufc/77730/3/2024_tese_oadalva.pdf