Da Redação
Sob pressão de tarifas de 50% dos EUA, governo Lula abre diálogo com Meta, Google, Apple e outras plataformas — mas sem sinalizar avanços em outras áreas estratégicas.
Brasília, 3 de agosto de 2025 — O governo brasileiro deu um sinal claro de flexibilização ao aceitar negociar com as big techs em meio à escalada de tensões comerciais com os Estados Unidos. Sob a ameaça de um tarifaço que poderia elevar em até 50% as tarifas sobre produtos brasileiros exportados ao mercado norte-americano, o Planalto decidiu abrir uma mesa de diálogo com empresas como Meta, Google, Apple, Amazon, Visa, Mastercard e Expedia. O objetivo declarado é buscar uma saída diplomática que neutralize o impacto imediato das sanções econômicas, mas a forma e o momento dessa decisão levantam críticas sobre os riscos de capitulação estratégica.
O ponto central da negociação é a regulação de conteúdo e concorrência no mercado digital. Executivos das plataformas pressionaram o governo a reavaliar decisões judiciais consideradas hostis, solicitaram isenções fiscais para data centers e exigiram garantias de segurança jurídica para suas operações no Brasil. Em resposta, o vice-presidente Geraldo Alckmin e sua equipe do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio sinalizaram disposição para discutir um novo marco regulatório, focado em combater práticas nocivas e fortalecer a atuação do CADE.
Embora oficialmente o governo tenha restringido o escopo dessas negociações ao ambiente digital, há uma crescente preocupação entre especialistas e analistas de que este movimento seja apenas o primeiro passo de uma estratégia de pressões contínuas. A aceitação em sentar-se à mesa com as big techs, em um contexto de ameaças econômicas diretas, transmite uma imagem de fragilidade que pode ser explorada em futuras disputas envolvendo setores muito mais sensíveis.
O temor é que, após ceder na agenda digital, o Brasil acabe sendo pressionado a flexibilizar sua posição em outras frentes estratégicas, como a política industrial, a exploração de terras raras, a política de infraestrutura logística — incluindo a Ferrovia Bioceânica — e até mesmo sua posição geopolítica dentro do BRICS. Ainda que nenhuma dessas pautas tenha sido formalmente incluída nas tratativas atuais, a lógica de negociação imposta pelos Estados Unidos estabelece um precedente perigoso: a troca de pequenas vitórias pontuais em troca de uma submissão progressiva nos temas estruturantes da soberania nacional.
É importante destacar que o governo brasileiro, ao se apresentar como parte interessada em “apaziguar tensões” com as plataformas, assume uma postura reativa, tentando administrar os efeitos imediatos do conflito tarifário, mas sem apresentar uma estratégia proativa de enfrentamento das causas estruturais dessa dependência tecnológica. A ausência de um projeto nacional robusto para o setor digital — baseado em infraestrutura própria, regulação soberana e fomento à inovação local — agrava ainda mais a vulnerabilidade do Brasil neste cenário.
O argumento central da crítica não está no ato de negociar em si, mas na forma e nas circunstâncias em que essas conversas foram abertas. A imagem transmitida ao mundo é a de um país que, diante da ameaça de sanções, opta por recuar, abrindo margem para que a pressão econômica norte-americana seja convertida em ganhos de longo prazo para as big techs e seus patrocinadores. Mais do que evitar um tarifaço, o Brasil corre o risco de institucionalizar sua dependência em setores-chave da economia do século XXI.
Portanto, a flexibilização das conversas com as big techs, no contexto atual, representa um erro basilar do governo. Trata-se de um movimento que pode, a curto prazo, aliviar pressões comerciais, mas que também abre um perigoso precedente de vulnerabilidade estrutural. A mensagem transmitida ao exterior é inequívoca: “vocês suspendem as tarifas agora, mas mantêm o superávit esmagador sobre o Brasil e continuam com a arma apontada para nossa cabeça até 2026”.
A questão central não é apenas a negociação com as big techs, mas o risco de essa postura evoluir para uma lógica de concessões sucessivas em outras áreas críticas, configurando um processo de desmonte progressivo da capacidade de ação soberana do Estado brasileiro.