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James Webb não encontra atmosfera “tipo Terra”

Da Redação

Novas observações do Telescópio Espacial James Webb descartam uma atmosfera semelhante à da Terra no exoplaneta TRAPPIST-1d. O resultado, publicado por um consórcio internacional, estreita a busca por mundos habitáveis em torno de anãs vermelhas — sem sepultar a esperança nos planetas mais externos do mesmo sistema.

A missão mais aguardada da astronomia exoplanetária em 2025 entregou um balde de água fria — e ciência de primeira. Usando o espectrógrafo NIRSpec do Telescópio Espacial James Webb (JWST), uma equipe internacional analisou dois trânsitos do planeta TRAPPIST-1d, um mundo rochoso com tamanho próximo ao da Terra que orbita uma estrela anã ultrafria a cerca de 40 anos-luz. O espectro combinado, cobrindo de 0,6 a 5,2 mícrons, não mostrou as “assinaturas” de moléculas comuns em atmosferas terrestres, como vapor d’água, metano e dióxido de carbono. Na prática, caiu por terra a hipótese de uma atmosfera “tipo Terra” no planeta.

Os autores relatam que a própria estrela, TRAPPIST-1, complicou a leitura: manchas e regiões magneticamente ativas que não foram ocultadas durante o trânsito criaram inclinações artificiais no espectro. Após correções ancoradas no brilho estelar medido fora do trânsito, o sinal do planeta ficou essencialmente “chato” — variações insuficientes para revelar bandas moleculares. O resultado permite excluir, com alta confiança, atmosferas claras ricas em hidrogênio e também composições “de alta massa molar” análogas a Titã, Vênus sem nuvens, Marte primitivo e até cenários de Terra arcaica e moderna sem cobertura de nuvens.

Se TRAPPIST-1d tiver ar, ele deve ser extremamente ralo, semelhante ao de Marte, ou então encoberto por aerossóis em grande altitude que “achatam” as assinaturas espectrais — um caso mais próximo ao de Vênus. Outra possibilidade é não haver atmosfera alguma: um bloco de rocha exposto ao espaço. A equipe também modelou a evolução do sistema e concluiu que, se b, c e d forem mundos sem ar, esses planetas provavelmente se formaram com inventário hídrico modesto, o que impacta as expectativas de voláteis para os irmãos mais frios.

O veredito sobre d soma-se a uma sequência de “más notícias” para os mundos mais internos do sistema. Em 2023, o Webb já havia descartado uma atmosfera espessa de CO₂ em TRAPPIST-1c, e estudos indicaram que o planeta mais interno, TRAPPIST-1b, é muito provavelmente uma rocha nua. A tendência sugere que a radiação e as erupções frequentes de uma anã M8 — estrelas pequenas, frias e hiperativas — erodem ou impedem a retenção de atmosferas nos planetas mais próximos.

Ainda assim, todas as fichas não estão perdidas. Os planetas mais externos do sistema — especialmente e, f e g — recebem menos fluxo energético e podem ter mais chance de preservar invólucros gasosos. A própria equipe do estudo ressalta que o próximo passo é empregar outras técnicas, como medições de emissões térmicas em eclipses secundários e curvas de fase, e acumular mais trânsitos para testar cenários com nuvens altas e água condensada na linha que separa o dia e a noite do planeta. Se houver atmosfera tênue, ela poderá se revelar com observações mais longas ou em outros comprimentos de onda.

O caso TRAPPIST-1d também é um aprendizado metodológico. Separar o “ruído” da estrela do “sussurro” do planeta virou condição essencial para a ciência de atmosferas terrestres. A comunidade já vinha mapeando estratégias para lidar com a contaminação estelar — da fotometria de alta cadência ao uso de modelos magnetoestelares — e agora tem um estudo-padrão que quantifica os vieses e mostra como corrigi-los na prática. Em resumo: não basta apontar o Webb; é preciso decifrar a estrela antes de interpretar o planeta.

A importância disso vai além do nicho acadêmico. Anãs vermelhas são as estrelas mais comuns da Via Láctea. Se um planeta do tamanho da Terra consegue manter ar respirável num ambiente de radiação intensa e erupções frequentes, a chance de existirem outros mundos temperados se multiplica. O inverso também vale: quanto mais os TRAPPISTs internos se mostrarem áridos, mais a busca por “gêmeos da Terra” tende a migrar para órbitas mais largas e para estrelas mais estáveis.

Em termos de parâmetros físicos, TRAPPIST-1d tem raio de cerca de 0,8 vez o da Terra, massa em torno de 40% da terrestre e período orbital de quatro dias; orbita na borda interna da zona temperada do sistema, com temperatura de equilíbrio próxima a 260 kelvin. Esses números alimentam tanto a expectativa quanto explicam o desafio em detectar ar: pequenos planetas geram sinais minúsculos, e a estrela hospedeira é altamente ativa. O “não” robusto às atmosferas claras é, paradoxalmente, um avanço, pois elimina hipóteses e afunila o roteiro de observações futuras.

Do ponto de vista científico e público, este é um daqueles resultados que mudam o enquadramento do debate: o Webb não “matou” a habitabilidade de TRAPPIST-1, mas a está definindo com mais rigor. A ciência progride tanto com descobertas quanto com exclusões. E, neste agosto, a comunidade ganhou algo valioso: limites estritos, métodos refinados e um mapa mais nítido do que procurar — e onde — quando a missão é achar atmosferas em mundos realmente pequenos.