Servidores e especialistas alertam para os efeitos da reforma administrativa no atendimento à população, na precarização do trabalho público e na captura de recursos pelo rentismo
O que está em jogo na reforma administrativa, segundo os convidados do Democracia no Ar, é menos uma mudança de regras e mais a erosão da capacidade do Estado de garantir políticas sociais. A entrevista foi ao ar em 2 de outubro, no programa da Rádio e TV Atitude Popular apresentado por Sara Goes, com participação de Liliana Gomes, Cristiano Machado e Paulo Lindesay, e está disponível no canal da emissora no YouTube.
O diretor da executiva nacional da Assibge, Paulo Lindesay, sintetizou o diagnóstico, “estamos diante de uma reforma que, na realidade, é uma demolição do Estado social brasileiro”, disse, relacionando a pauta a um arcabouço jurídico e fiscal que desloca recursos para o serviço da dívida e empurra a execução das políticas para a iniciativa privada. “Quando os serviços públicos se fragilizam, quem paga é a população mais carente”, afirmou, ao criticar a narrativa de modernização que embala o tema e ao lembrar que super salários e férias estendidas atingem frações ínfimas, distantes do cotidiano da maioria do funcionalismo.
Cristiano Machado, servidor do INSS e dirigente do Sinsprev SP e da Fenasps, destacou que o desmonte já avança por vias administrativas, antes mesmo de novas leis. “Serviço público não é mercadoria”, pontuou, ao explicar que a combinação de terceirização ampla, metas descoladas da realidade e bonificações que substituem salário desestrutura carreiras e piora a prestação ao cidadão. “A estabilidade não é privilégio, é condição para que o servidor cumpra a lei mesmo diante de pressões políticas. Sem estabilidade, muda governo, muda tudo”, disse. Ele também lembrou a importância do corpo técnico durante a pandemia e em casos recentes de fiscalização, defendendo que “o país sentiu na pele o preço do desmonte quando se desativam sistemas de controle e se asfixia a capacidade de fiscalização”.
Liliana Gomes, servidora aposentada do INSS, advogada e integrante do coletivo Vamos à Luta, trouxe o impacto concreto das mudanças no atendimento previdenciário. “As pessoas viram número, fila, meta. O programa de gestão e desempenho, aplicado por portaria, fragiliza o serviço e adoece o servidor”, disse. Ela criticou o teletrabalho imposto sem suporte, que transfere custos de infraestrutura para o trabalhador, e a reestruturação de carreiras que empurra a remuneração para gratificações instáveis. “É inseguro para quem trabalha e para quem precisa do benefício, porque gratificação se cria e se extingue”, afirmou. Sobre a chamada transversalidade, defendeu que deslocamentos permanentes entre áreas “criam o servidor faz tudo, sem especialização, o que precariza a entrega”.
Ao relacionar o calendário político recente à pauta econômica, os convidados avaliaram que a aprovação da nova faixa de isenção do Imposto de Renda alivia setores formais, mas não enfrenta a regressividade tributária, a informalidade e os efeitos acumulados da reforma trabalhista e da previdência. “É um avanço, porém muito aquém da perda de direitos dos últimos anos”, avaliou Cristiano. Para Lindesay, a rapidez de votações unânimes no Congresso reforça a necessidade de vigilância, “se em poucas semanas muda de maioria contrária para 483 a 0, é legítimo perguntar qual foi o custo político”.
A dimensão orçamentária apareceu como pilar do debate. Lindesay descreveu o orçamento primário como alvo da captura privada, enquanto a dívida tem privilégios constitucionais de pagamento, “é esse orçamento que querem tomar, reduzindo investimento em pessoal, saúde e educação, e terceirizando a execução”. No mesmo sentido, Cristiano citou a expansão de organizações sociais na saúde municipal, com piores indicadores e mais custos, “é a lógica da mercantilização do que deveria ser direito”.
Os três convergiram num chamado à mobilização unitária de servidores federais, estaduais e municipais, vinculando a defesa do serviço público ao interesse direto do usuário que enfrenta filas, carências e desigualdades. “A população precisa e merece um serviço forte e digno”, disse Liliana. Cristiano reforçou a agenda de rua, “há uma chamada do Fórum Nacional dos Servidores Federais para um dia nacional de luta em 29 de outubro, é hora de unificar categorias”. Lindesay concluiu que o enfrentamento passa por reverter medidas infralegais e por repor o concurso público como regra de ingresso, “sem concurso, abre-se a porta ao apadrinhamento e à rotatividade, o que corrói o Estado por dentro”.
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