Convidadas analisam a inflexão da cobertura sobre Gaza, a vitória do governo no Imposto de Renda e o desmonte da PEC da bandidagem, com críticas à fabricação midiática de um bolsonarismo moderado e ao vaivém de Tarcísio de Freitas
A disputa pelo sentido das notícias no Brasil, da cobertura de Gaza às manobras no Congresso, foi o fio que guiou a edição desta sexta, 03 de outubro, do Democracia no Ar, com apresentação de Sara Goes. O programa recebeu a jornalista e pesquisadora Eliara Santana e a professora de filosofia Sandra Helena para destrinchar como os principais veículos moldam, silenciam ou deslocam temas centrais da conjuntura. As análises e declarações a seguir foram dadas ao vivo no programa e são a base desta reportagem
Logo na abertura, Sandra situou o eixo internacional. Ao comentar a crise em Gaza e a semana da ONU, ela apontou o desgaste do enquadramento tradicional que dominou telejornais e jornais brasileiros. “A gente vinha acompanhando uma visão profundamente unilateral, o significante era guerra contra o grupo terrorista, enquanto os cadáveres iam se acumulando”, disse. Para ela, setembro marcou um ponto de inflexão, com “quebra de consenso” e exposição pública do isolamento do premiê israelense. “Netanyahu discursou para uma plateia praticamente vazia, delegações saindo do salão, inclusive a do Brasil”, relatou. Sandra criticou ainda o chamado plano de paz, que descreveu como projeto de tutela externa, “um protetorado com regras impostas de fora”, em choque com a ideia de soberania
No terreno doméstico, as convidadas destacaram a vitória governista na atualização da tabela do Imposto de Renda e o sepultamento da PEC batizada nas ruas de bandidagem. Sandra sublinhou a escolha de palavras como disputa material por sentido. “Quando o governo perde, a manchete vem em capslock. Quando vence, some o sujeito da ação”, observou, citando casos recentes na cobertura de portais e telejornais. Para Eliara, o resultado no Congresso não se explica sem a mobilização popular e o entrelaçamento com o ambiente digital. “Foi uma vitória respaldada pelas ruas”, disse. Em seguida, arrematou a síntese do momento político comunicacional: “Não há rua sem redes e redes sem ruas”
As duas também miraram a intoxicação por metanol em bares paulistanos e o comportamento da mídia e das autoridades. Eliara analisou o arranjo narrativo que ganhou corpo após as coletivas em Brasília e em São Paulo. Segundo ela, a forma de edição no principal telejornal da TV aberta evidenciou a resposta federal, com o diagnóstico de que o episódio foge do padrão de falsificação corriqueira e exige ação coordenada. Sandra chamou atenção para a tentativa de certos grupos de empurrar a agenda de segurança para uma equiparação de facções criminosas a terrorismo, enquanto minimizam sinais de captura privada de políticas públicas nos estados
Outro vetor do debate foi a disputa pelo comando do campo bolsonarista. Eliara expôs por que parte da imprensa paulista busca fabricar um bolsonarismo moderado para sustentar a viabilidade de Tarcísio de Freitas, movimento que esbarra no vínculo estrutural do governador com o ex-presidente. “A Globo não aderiu ao Tarcísio”, disse, avaliando que a candidatura presidencial oscila e não se sustenta sem o carimbo do bolsonarismo raiz. Em uma imagem forte sobre a falta de estofo político do personagem, ela cravou: “Tarcísio é um ácaro político, não tem bagagem, sempre desejam por ele”. Sandra conectou o tabuleiro às tensões internas da família Bolsonaro, aos recuos táticos de Michelle e às performances de figuras digitais que perseguem adversários por meio de listas e campanhas hostis
As convidadas mapearam, ainda, a virada de tom da Record e a manutenção de blindagens seletivas em outros veículos. Eliara resumiu a temporada que se inicia nas redações: “O Jornal Nacional entrou no modo eleições”, com mais pauta internacional, mais esporte e um enquadramento asséptico para temas que desgastam interesses oligopolistas. A avaliação converge com a aposta de Sandra em acompanhar o comportamento dos atores que recuam, como parcela do bolsonarismo parlamentar, e os que testam novas narrativas de vitimização que não decolam
A edição terminou onde começou, no vínculo entre soberania e linguagem. Do plano dito de paz para Gaza à reconfiguração da agenda econômica no Brasil, o que está em jogo, afirmaram, é a luta para nomear o real de forma inteligível para a maioria social. A pedagogia política, nas palavras delas, exige traduzir o distante em cotidiano e devolver protagonismo às pessoas comuns, nas ruas e nas redes. “A linguagem é poderosa, a narrativa é poderosa”, disse Eliara. Em outubro, com eleições municipais à vista e rearranjos no noticiário, esse poder será posto à prova todos os dias
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