Orlando Alves Ribeiro defende a arte como pilar social, denuncia a desigualdade que rouba futuro e anuncia seu primeiro livro de poesias, projeto que enfrenta de frente o gargalo do financiamento cultural
A conversa com o escritor e poeta Orlando Alves Ribeiro no programa Café com Democracia percorreu a espinha dorsal do tema proposto, arte e cultura em um país de gargalos e desafios, e fincou no chão duas ideias principais, a potência agregadora da criação cultural e a urgência de reatar vínculos coletivos onde a desigualdade corrói direitos e esperanças. A entrevista foi ao ar pela TV Atitude Popular, com retransmissão por rádios parceiras e participação de ouvintes ao vivo no chat do YouTube.
Logo no início, Orlando resumiu a experiência que carrega de saraus e encontros literários, ambientes onde a convivência se dá em torno do sensível e do comum. Nas suas palavras, arte e cultura formam dois pilares de construção humana e social, capazes de provocar alegria compartilhada e reduzir tensões. O programa destacou mensagens do público e convidou o poeta a abrir a conversa com um poema sobre infância vulnerável e sobrevivência nas ruas, peça que ele apresentou emocionado ao explicar que escreve para extravasar dores alheias num país que ainda falha em proteger os seus.
A tônica do debate foi a contraposição entre individualismo e solidariedade. Em resposta a uma provocação de Luiz Regadas sobre a dificuldade de sentir a dor do outro, Orlando foi direto, “nós não somos seres individuais, nós somos seres coletivos”. A partir daí, desenvolveu um raciocínio que liga escolhas privadas a consequências públicas, lembrando que até o voto, gesto solitário na urna, produz efeitos sobre a vida de milhões. Para ele, desigualdade extrema e ganância alimentam ciclos de sofrimento social, ansiedade e depressão, cenário agravado por distorções no uso de recursos públicos.
O escritor não se limitou à crítica abstrata. Ao tratar de orçamento e emendas, afirmou que falta transparência e que o desvio de prioridades custa caro para quem mais precisa. A reflexão desencadeou comentários do público sobre consumismo e precarização da vida urbana, com exemplos locais de desmatamento e impactos sobre a fauna, tema que motivou o poeta a anunciar presença em um protesto popular.
A entrevista também abriu espaço para referências e homenagens. Ao mencionar a Amazônia, Orlando citou a jornalista e escritora Eliane Brum e a decisão dela de viver em Altamira para acompanhar e denunciar conflitos fundiários, violência e desmatamento. O poema que leu em seguida, atravessado por imagens de sangue na terra e silenciamentos, foi apresentado como gesto de solidariedade às vítimas de grilagem e expulsão. A escolha reforçou a defesa de uma literatura que se compromete com a vida concreta e com a justiça.
O percurso biográfico apareceu no diálogo sobre o livro Engrenagem, lançado em 2023 com apoio do BNB Cultural. São treze contos e nove poemas, muitos dedicados às lutas das mulheres e às dores do mundo, tema recorrente no trabalho do autor. Ele contou que prepara seu primeiro volume exclusivo de poesia e que enfrenta, como tantos artistas, o gargalo do financiamento cultural. Entre buscar editais públicos, vaquinhas e soluções caseiras, não descarta usar patrimônio pessoal para viabilizar a edição com uma casa editorial cearense, desejo que expressou como compromisso afetivo com o circuito literário local.
Em tom mais existencial, Orlando discutiu a relação entre renda e bem-estar. Na sua leitura, a concentração de dinheiro em poucas mãos empurra a maioria para um cotidiano exaustivo e sem horizonte, alimentando desesperança. Diante da provocação de que poderia ser chamado de comunista por defender o outro, respondeu com ironia e firmeza, “se ao querer o bem-estar do outro isso for comunismo para muitas pessoas, então eu sou, com muito orgulho”, invocando uma lembrança de Dom Hélder Câmara para marcar o ponto de vista solidário.
Os poemas voltaram a pautar o final da entrevista. Em Triunfo, Orlando celebra a conquista coletiva de direitos e a travessia para um lugar onde água limpa e justiça sejam de todos, imagem que ele trouxe como antídoto poético ao desencanto. No encerramento, leu Tintas para um dia blue, breve inventário de céu, nuvens e estrelas usado como matéria para pintar de esperança o cotidiano. As leituras funcionaram como prova de método, a poesia, disse ele, é ponte para nomear sofrimentos e, também, para sustentar alegria, amor e perseverança.
A conversa deixou lições sobre política cultural sem tecnicismos e sem ilusões. Quem ouviu pôde enxergar a cultura como prática que reduz distâncias, algo que se faz em bibliotecas, clubes de leitura, praças, escolas, saraus, web rádios, pequenos estúdios caseiros e palcos improvisados. Pôde perceber, sobretudo, que a defesa do comum não se cumpre só no discurso, ela se comprova na persistência de quem escreve, organiza, convida e lê junto, mesmo quando o dinheiro falta e as portas não se abrem na primeira tentativa.
Ao final, Orlando reforçou o plano de selecionar os poemas do primeiro livro com a ajuda de parceiros de longa data, reafirmou a crença de que a vida continua bonita apesar dos pesares e que nenhuma política pública fará sentido se não nascer do reconhecimento do outro. Ficou a frase que melhor resume sua defesa do comum e que dá título a esta matéria, “nós não somos seres individuais, somos seres coletivos”.
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