A adoção da abordagem territorial no Brasil vem se consolidando como estratégia decisiva para enfrentar desigualdades estruturais, desafios ambientais e limites administrativos dos pequenos municípios. Ao articular cooperação intermunicipal, planejamento compartilhado, participação social e inovação democrática, os territórios de identidade ampliam a capacidade de formulação de políticas públicas, fortalecem economias locais e conectam a agenda do desenvolvimento às pautas de justiça social e climática
A abordagem territorial, especialmente quando aplicada a territórios de identidade de caráter intermunicipal, representa uma inovação importante na gestão de políticas públicas no Brasil. Essa perspectiva tem se mostrado fundamental sobretudo no Nordeste, onde a maioria dos municípios possui menos de 50 mil habitantes, baixa densidade populacional e enfrenta desafios estruturais para implementar políticas de forma isolada. Muitas dessas cidades lidam com limitações como baixa capacidade administrativa e financeira, dificuldades logísticas para atender uma população dispersa, infraestrutura pública insuficiente e baixo dinamismo econômico, principalmente nos setores de inovação e serviços.
Ao adotar o território como unidade de planejamento, cria-se uma escala mais adequada para a formulação e execução de políticas públicas. A união de municípios em um mesmo território viabiliza a instalação de equipamentos regionais, melhora o planejamento da infraestrutura e do transporte, favorece o compartilhamento de recursos técnicos e administrativos e gera sinergias que dificilmente seriam alcançadas de maneira isolada. Essa cooperação fortalece os vínculos horizontais entre prefeituras, promove a troca de boas práticas, permite a criação de consórcios públicos e alianças intermunicipais para captação de recursos e amplia a capacidade de execução de projetos.
A dimensão econômica também se beneficia dessa articulação. Redes locais de produção e consumo reduzem a dependência de mercados externos e fortalecem circuitos curtos de comercialização, impulsionando a economia popular e solidária. Arranjos produtivos locais em áreas como artesanato, agricultura familiar, turismo comunitário e agroindústria potencializam vocações econômicas, ampliam oportunidades e enraízam o desenvolvimento nas comunidades.
Outro ponto central é o planejamento com identidade. Ao respeitar as dimensões culturais, sociais e ambientais, a abordagem territorial favorece projetos adaptados às realidades locais, reforça a autoestima, amplia a participação social e promove a coesão. Além disso, a capacidade de captação de recursos é fortalecida, já que territórios articulados conseguem acessar fundos federais e internacionais com maior facilidade, apresentando projetos mais robustos e regionalmente integrados.
No campo da governança, a escala intermunicipal amplia as possibilidades de participação social na gestão pública. A horizontalidade entre representantes de municípios maiores e menores e a ausência de hierarquias impositivas aumentam a autonomia e a legitimidade dos acordos firmados. A busca pelo consenso, em vez de decisões impostas, torna o processo mais democrático e transparente, reduz resistências e facilita a implementação das políticas. Esse modelo favorece ainda a inovação e a flexibilidade, permitindo testar novas abordagens e ajustar estratégias continuamente.
A abordagem territorial também se mostra fundamental diante dos desafios ambientais e da emergência climática. Problemas como estiagens prolongadas, inundações, deslizamentos de terra, conflitos pelo uso da água e queda na polinização, bem como ativos como aquíferos e reservas naturais, ultrapassam limites administrativos e exigem soluções coletivas. A cooperação intermunicipal permite elaborar diagnósticos integrados, compartilhar informações e articular respostas conjuntas.
Entre os avanços possíveis estão a construção de políticas ambientais regionais; o fortalecimento de práticas agroecológicas ligadas à produção de alimentos saudáveis; a criação de territórios agroecológicos climaticamente inteligentes, que conservam água, ampliam a biodiversidade, protegem o solo e produzem energia renovável; a implementação de sistemas de pagamento por serviços ambientais; e a integração entre produção rural e preservação ambiental, conciliando geração de renda e conservação dos ecossistemas.
Essas iniciativas ganham ainda mais importância no Semiárido nordestino, onde os efeitos da crise climática são mais severos e onde a agricultura familiar e a produção sustentável precisam estar articuladas com políticas públicas de combate à fome, segurança hídrica, economia solidária e adaptação climática. Nesse sentido, a abordagem territorial conecta o desenvolvimento local à agenda global de justiça ambiental.
Por fim, destaca-se o papel das Conferências Nacionais e Territoriais de Políticas Públicas, especialmente durante os governos Lula e Dilma, como espaços decisivos de participação social. Ao reunir lideranças sociais e políticas, técnicos e representantes do poder público em diferentes escalas — municipal, territorial, estadual, regional e nacional — essas conferências consolidam o território de identidade como unidade intermediária de mobilização, fortalecem o intercâmbio de saberes e fomentam redes de governança compartilhada, capazes de transformar diretrizes em ações concretas.
Assim, ao integrar cooperação municipal, governança democrática, participação social e enfrentamento da emergência climática, a abordagem territorial se afirma como uma estratégia indispensável para a promoção de um desenvolvimento justo, inclusivo, sustentável e resiliente no Brasil.
Material Produzido Por:
Câmara Temática da Agricultura Familiar do Consórcio Nordeste
IICA – Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura
CET – Coordenação Estadual dos Territórios de Identidade da Bahia
CAR – Companhia de Desenvolvimento e Ação Regional
Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional
Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar
Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social – Família e Combate à Fome
Secretaria-Geral da Presidência da República
Ministério do Trabalho e Emprego
Secretaria de Desenvolvimento Rural e Secretaria do Planejamento do Governo do Estado da Bahia