Debate promovido pela TV Atitude Popular com Samira Castro, presidenta da Fenaj, expõe riscos trabalhistas, dilemas éticos e o impacto das big techs no futuro da profissão
O programa Democracia no Ar, transmitido pela TV Atitude Popular, dedicou uma edição especial para discutir a ameaça que a inteligência artificial representa para o jornalismo. A convidada foi Samira Castro, presidenta da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), que apresentou dados alarmantes sobre a redução de postos de trabalho e alertou para a urgência de regulação no Brasil.
Segundo levantamento da Fenaj em parceria com o Dieese, os jornalistas perderam 18% dos empregos com carteira assinada entre 2013 e 2023. “A profissão já vinha sendo precarizada e agora enfrenta a substituição direta por sistemas de IA. Só no caso dos fotojornalistas, mais de 50% dos postos formais desapareceram nesse período”, destacou Samira.
Ética e manipulação digital
Durante a entrevista, a dirigente sindical sublinhou a diferença entre apuração jornalística e produção automática de conteúdo. “A inteligência artificial não vai para a rua, não entrevista fontes, não observa nuances do real. Ela obedece a comandos. O risco é transformar a notícia em simples produto de clique, sem responsabilidade social”, afirmou.
Exemplos recentes reforçam essa preocupação. No Congresso do PL, vídeos manipulados com Michele Bolsonaro foram usados para treinar militância digital, evidenciando como a IA pode ser instrumentalizada na política. Samira comparou essa prática com casos de manipulação de imagens jornalísticas: “Uma charge é interpretação, é autoral. Mas criar imagens hiper-realistas de fatos que não aconteceram é enganar o público”.
O caso Felca e o jornalismo independente
O debate também trouxe à tona o documentário do youtuber Felca sobre exploração infantil nas redes, que desencadeou mudanças no Congresso. Apesar de não ser jornalista, sua investigação colaborativa revelou lacunas na cobertura tradicional. Para Samira, esse episódio expõe tanto a força quanto os limites do jornalismo cidadão: “Foi um trabalho sério, mas também mostrou que só a apuração profissional garante responsabilidade, checagem e cuidado com vítimas e acusados”.
Big techs e precarização
A presidenta da Fenaj denunciou ainda a influência das big techs no Congresso Nacional, lembrando o lobby que derrubou o PL 2630, conhecido como PL das Fake News. “A disputa agora é pelo PL da IA. As plataformas estão com peso desproporcional nas audiências públicas. Se jornalistas não se organizarem, ficaremos fora de qualquer previsão de remuneração pelo uso de nossos conteúdos para treinar sistemas”, alertou.
Ela relatou casos de redações inteiras substituídas por IA, como o de uma revista digital paulista que demitiu todos os repórteres, mas manteve a publicação de textos assinados por um nome fictício criado por algoritmos. “É desrespeito com os trabalhadores e com o público. A informação virou colagem automática de matérias antigas e concorrentes.”
Solidariedade internacional e riscos à vida
O programa também abordou a escalada da violência contra jornalistas em Gaza. Mais de 260 profissionais já foram mortos desde o início da ofensiva israelense. A Fenaj, em articulação com sindicatos internacionais, propôs um dia mundial de solidariedade e o envio de apoio material à imprensa local. “Jornalistas, médicos e crianças são alvos preferenciais. Isso é genocídio televisionado. Defender o jornalismo é também defender a vida”, ressaltou Samira.
Um futuro em disputa
No encerramento, a presidenta da Fenaj convocou a categoria a fortalecer a luta sindical diante dos impactos da automação e da precarização. “Os patrões querem mais entrega com menos gente. Mas somos nós que produzimos a informação que alimenta essas inteligências artificiais. Nossa luta é para que esse valor chegue na ponta, ao trabalhador e à trabalhadora jornalista.”
O debate deixou claro que o embate não é apenas tecnológico. É ético, político e social. Entre algoritmos e redações cada vez mais esvaziadas, a questão central permanece: sem jornalistas, quem garante o direito da sociedade à informação verdadeira?
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