Atitude Popular

Helena Serra Azul: “Nada como o tempo, nada como a verdade”

Em entrevista ao Democracia no Ar, Helena Serra Azul defende a memória como prática de resistência e critica o esvaziamento político da Comissão de Anistia Wanda Sidou

No programa Democracia no Ar, transmitido pela TV Atitude Popular, a convidada Helena Serra Azul fez um mergulho histórico e político na construção da memória da resistência à ditadura militar no Ceará e no Brasil. A entrevista, conduzida por Sara Goes, contou com comentários da pesquisadora Sandra Helena e recuperou não apenas os bastidores da criação da Comissão de Anistia Wanda Sidou, mas também o papel das mulheres, dos ex-presos políticos e das disputas que ainda marcam os caminhos da justiça de transição no país.

“Eu enfrentei a ditadura, nunca mudei de posição e não vou mudar agora”, afirmou Helena ao comentar seu afastamento da atual composição da comissão estadual. Segundo ela, a substituição foi feita sem consulta nem diálogo com os nomes históricos da luta pela anistia no estado. “A gente tinha apoio de ex-presos políticos, tínhamos um abaixo-assinado. De repente, fomos retirados. Isso não se faz”, criticou.

A entrevista também revisita o nascimento da associação 64/68, movimento civil criado no final dos anos 1990 por ex-presos políticos do Ceará para manter viva a memória da repressão e sistematizar denúncias de violações. Entre os nomes lembrados estão Mário Albuquerque, Messias Pontes, Iracema, Chico, Machado e tantos outros militantes que viabilizaram reuniões, viagens e o envio de documentos mesmo sem qualquer apoio oficial.

Helena resgatou o papel decisivo da Dra. Wanda Sidou, homenageada na comissão cearense criada por lei estadual. “A Dra. Wanda foi um porto seguro. Uma mulher que não se dobrava, que defendeu inúmeros presos políticos. Uma heroína nossa”, declarou.

A conversa, no entanto, foi além do resgate histórico. Helena e Sandra traçaram paralelos com o cenário atual: o avanço da extrema direita, a ofensiva contra a memória e o desmonte dos mecanismos de justiça transicional. “A gente vive uma inversão perigosa, com jovens reacionários que sentem saudade de uma ditadura que não viveram”, observou Sara durante a mediação.

Sandra Helena acrescentou: “O que acontece hoje é continuidade. O golpe de 2016 foi também contra a memória. O voto de Bolsonaro, homenageando um torturador, foi o prenúncio do que viria. E a imprensa tratou tudo com normalidade.” Ela relembrou ainda que a Comissão Nacional da Verdade foi uma das razões pelas quais setores reacionários nunca perdoaram Dilma Rousseff. “Foi uma comissão capenga, sem justiça, mas que mesmo assim gerou ódio. Porque ousou mexer na impunidade.”

A conversa também percorreu os momentos de retomada da resistência nos anos 2000, o papel das universidades nas comissões da verdade e a importância das mulheres militantes, com destaque para as presas políticas do Bom Pastor. Ao citar o documentário Vou contar pros meus filhos, Helena se emocionou: “Hoje, poucas daquelas mulheres ainda estão vivas. A gente tem que continuar resistindo. Essa memória é nossa responsabilidade.”

A fala final da convidada trouxe a crítica à confusão intencional entre o conceito original de anistia e a impunidade pregada hoje por setores bolsonaristas: “Anistia era um processo de reparação para quem foi preso, torturado, perseguido. Agora querem chamar de anistia uma tentativa de apagar crimes contra a democracia. Não tem nada a ver.”

O programa termina com a reafirmação do compromisso coletivo com a luta por verdade, justiça e memória. “A história é uma disputa viva. E a nossa geração, mesmo que vá partindo, ainda tem muito a ensinar”, concluiu Helena.

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