Da Redação
Documentos revelam que Paulo Guedes e Sérgio Moro foram formalmente informados de descontos indevidos nos benefícios do INSS ainda no começo do governo Bolsonaro; associações suspeitas foram descredenciadas, mas denúncias só ganharam repercussão anos depois.
Em 2019, durante os primeiros meses da gestão presidencial de Jair Bolsonaro, os então ministros Paulo Guedes (Economia) e Sérgio Moro (Justiça) receberam alertas formais sobre fraudes envolvendo descontos indevidos de associações nos benefícios pagos pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). As denúncias tratavam de cobranças mensais realizadas sem autorização prévia dos aposentados, por meio de entidades conveniadas ao INSS.
As irregularidades foram trazidas ao conhecimento dos ministros através de diversos canais. Um ofício da Secretaria de Justiça de São Paulo, assinado por Fernando Capez, diretor executivo do Procon-SP, datado de 1º de agosto de 2019, relata que o órgão havia recebido mais de dezesseis mil atendimentos de beneficiários que reclamavam dos descontos associativos. Capez encaminhou para Sérgio Moro, ao secretário nacional do consumidor da época, Luciano Timm, e ao presidente do INSS, Renato Vieira, uma lista contendo dez entidades suspeitas de praticar esses descontos abusivos em aposentadorias e pensões.
Paralelamente, em fevereiro de 2019, o deputado federal Fábio Schiochet protocola um requerimento de esclarecimento ao Ministério da Economia, então sob Paulo Guedes, questionando a prática dos descontos sem anuência dos segurados. O gabinete de Guedes encaminhou resposta assinada também por Rogério Marinho, secretário especial de Previdência e Trabalho, afirmando que o INSS realizava fiscalizações periódicas nas entidades conveniadas. No documento, o INSS se comprometeu a suspender convênios suspeitos em caso de irregularidades.
Ainda em 2019, o presidente do INSS, Renato Vieira, teria se comprometido a descadastrar associações envolvidas nas irregularidades relatadas, após alerta do Procon-SP, mas deixou o cargo em janeiro de 2020. A troca de comando ocorreu após pressão institucional e política.
As entidades apontadas nas denúncias incluem organizações de aposentados e pensionistas, entre elas ABAMSP, Asbapi e Centrape. Essas mesmas associações entraram no centro de investigações posteriores, incluindo a Operação “Sem Desconto” da Polícia Federal, que apura o uso de descontos automáticos de mensalidades ou taxas sem autorização clara dos beneficiários.
Críticos apontam que, embora os alertas tenham sido feitos há muito tempo, as medidas efetivas de investigação e responsabilização só começaram a ganhar força anos depois, quando os casos vieram à tona por meio de reportagens investigativas e atuação da fiscalização federal. A visibilidade dessas denúncias cresceu com a CPI do INSS e com documentos que confirmam que os responsáveis já estavam cientes das irregularidades.
Para Guedes e Moro, seus defensores argumentam que houve reação institucional: entidades foram descredenciadas, houve resposta oficial a requerimentos parlamentares, e que existiam mecanismos de fiscalização administrativa. No entanto, para os críticos, essas ações foram insuficientes ou lentas diante do volume de denúncias.
A revelação reacende debates importantes no Brasil sobre controle social, proteção ao aposentado, transparência no uso de convênios públicos e responsabilidade de gestores públicos. Mostra também a importância da fiscalização contínua, atuação parlamentar ativa e papel da imprensa na exposição de irregularidades.